Semear invenções. Mediar encontros. Conectar imaginários.

Por Ana Bárbara Ramos e Felipe Leal Barquete

Em 2021, a Semente Cinematográfica germinou, e virou uma Escola de Educação Audiovisual! Nesse post, vamos compartilhar com você como esse movimento aconteceu – do cinema na educação para a educação audiovisual – e o que ele revela sobre o nosso propósito de trabalhar em parceria com as comunidades escolares do país.

Semente Cinematográfica foi o nome que escolhemos em 2014 para demarcar a nossa ação no campo do cinema e da educação. A escolha de um nome não define apenas um rótulo ou uma estratégia de comunicação com o nosso público. Através desse nome, nos vinculamos a um certo modo de lidar com o ato de educar, ou melhor, com o ato de estabelecer meios para investigar, refletir, inventar, ensinar e aprender.

Naquela época, nos propomos a evidenciar e desenvolver as possibilidades pedagógicas que afloram quando a educação e o cinema se encontram, a possibilidade de educar através da criação de filmes. Em relação à concepção tradicional de educação, tal iniciativa provoca deslocamentos importantes no processo de ensino-aprendizagem, tanto no que se refere à forma como um determinado saber é acessado e assimilado, e o modo como os conhecimentos são construídos, mas também na relação de ser, saber e poder que é estabelecida entre professores e estudantes, e entre a escola e a comunidade em que está inserida.

Embora tenha raízes históricas antigas, tal forma de trabalhar com o cinema e o audiovisual na escola é um fenômeno relativamente recente, e se disseminou a partir da popularização dos meios de produção digital da imagem através de dispositivos portáteis como as handycams e smartphones. Hoje em dia a presença do audiovisual na escola é uma realidade incontornável, sobretudo após o movimento de convergência digital forçada pela pandemia. Tanto as crianças e jovens quanto os adultos se transformaram em produtores, consumidores e retransmissores de imagens e sons nas redes sociais, na vida de uma forma geral, mas também na escola, de modo específico. Esse fato, no entanto, é visto muitas vezes como um problema pedagógico – um obstáculo no processo de aprendizagem dos estudantes – em detrimento de uma oportunidade pedagógica.

Entre 2014 e 2021, promovemos 15 cursos de formação de professoras, e constatamos que na grande maioria do casos, o imaginário de educadoras e educadores em relação ao audiovisual está ligado ao entretenimento, à indústria cultural, aos processos de produção caros e complexos. É compreensível que seja assim, em razão do modo como essa linguagem foi desenvolvida e mobilizada historicamente na sociedade. Constatamos que é precisamente esse imaginário que bloqueia, ou obstrui, o entendimento das possibilidades pedagógicas do audiovisual, e consequentemente gera uma indisposição para se apropriar das tecnologias digitais em sala de aula.

 

Curso de formação de professores realizado no Projeto Cartografia de Imagens, apoiado pelo Rumos Itaú Cultural, João Pessoa/PB (2018)

 

Ao implementar os saberes, habilidades e as possibilidades de mediação de aprendizagens do campo do audiovisual no currículo e no cotidiano escolar, a escola passa a encarar o que antes era um problema como uma potência de qualificação da aprendizagem. Ao invés de controlar o uso do celular que provoca distração e indisciplina, podemos estimular o engajamento do estudante na sua realidade através deles, abrindo portas para um território de aprendizagem habitado por encontros e interações: entre o ver, o sentir e o pensar; entre os estudantes e a cidade ou a natureza; entre o saber escolar e os saberes da comunidade. Nesse lugar se aprende a cultivar uma atenção pelo mundo; se aprende a escutar si mesmo, os outros e a natureza; se aprende a articular os saberes escolares na reflexão que parte da investigação concreta da realidade social; se aprende a construir conhecimentos, elaborar visões de mundo e partilhar sensibilidades através das imagens e dos sons.

Com a mediação de práticas educativas com o audiovisual, a escola se abre para território do qual faz parte, e essa conexão potencializa o campo de interações entre professores, estudantes e as pessoas, saberes e memórias da comunidade. A internet e as ferramentas digitais interativas possibilitam pesquisar referências e estabelecer novas conexões. Com a câmera na mão, no cineclube ou na ilha de edição, o estudante tem todo o mundo à sua disposição para pesquisar, produzir imagens e discursos, relacionar saberes e construir hipóteses e assertivas sobre determinado objeto do conhecimento. Os estudantes aprendem acessando e produzindo narrativas sobre as questões os afetam, e que são importantes para a sua vida e a vida daquilo e daqueles que constituem a sua realidade, vivenciando assim um processo de aprendizagem significativa.

Em outras palavras, quando a linguagem audiovisual é mobilizada como um instrumento de mediação de aprendizagens, o estudante é posicionado como um ser ativo na construção do seu próprio conhecimento, o que faz do professor um profissional que o auxilia nessa jornada de descobertas e invenções, identificando os temas geradores que os impulsionam, propondo dispositivos de criação, mediando experiências, relacionando saberes escolares, apresentando referências e consolidando aprendizagens vinculadas à uma configuração disciplinar, interdisciplinar ou transdisciplinar.

 

Prática educativa realizada na Escola Experimental de Cinema da EMEIF José Albino Pimentel, no quilombo do Gurugi-Ipiranga, Conde/PB (2017)

 

Foi com essa perspectiva criativo-pedagógica que nos envolvemos diretamente com mais de 10 escolas e 400 profissionais da educação nos últimos anos, e outros tantos de forma indireta através da promoção de eventos como mostras e seminários. Nas escolas, a ênfase do nosso trabalho é o desenvolvimento de metodologias contextualizadas à proposta pedagógica e à cultura escolar das instituições, e ao se abrir e trabalhar com as escolas desse modo, reconhecemos que elas semearam em nós uma transformação importante, que nos levou a compreender mais profundamente as necessidades de cada contexto, e a ampliar o nosso próprio entendimento da dimensão pedagógica da linguagem audiovisual.

Ao longo de 7 anos, contribuímos com o desenvolvimento de metodologias ativas audiovisuais articuladas com a educação tradicional, a educação popular, a educação transformadora, a pedagogia de projetos, a educação patrimonial, a educação socioemocional e socioambiental, além da arte-educação. Nesse processo, alargamos as nossas bases teórico-metodológicas, e aprendemos a nos conectar com aquilo que move de fato as educadoras em suas práticas – o afeto, o cuidado e a atenção ao desenvolvimento integral dos educandos, independente da metodologia aplicada.

Talvez a experiência mais definidora do nosso movimento de transformação foi a pandemia, pelo fato de que, em meio ao caos, à tristeza e às desigualdades sociais que impactam a educação brasileira e nos afetaram diretamente, nós buscamos apoio e apoiamos educadoras de todo o país, em um momento em que a linguagem audiovisual ganhou centralidade no contexto da educação remota e híbrida. As professoras e professores precisaram aprender a dominar novas habilidades técnicas e a desenvolver outras perspectivas metodológicas nesse contexto, e nós precisamos “esquecer” de nós mesmos, nossas preferências individuais, para desenvolver e apresentar modos de lidar com esse problema e de potencializar efetivamente as suas práticas.

Foi assim que passamos a assumir mais diretamente o conceito de “educação audiovisual”, ampliando a nossa abordagem que nasceu com ênfase na arte-educação, a desenvolvemos uma nova matriz pedagógica, articulando a tecnologia e a linguagem audiovisual com a Base Nacional Curricular Comum (BNCC) e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU (ODS).

Nesse ínterim, acolhemos novos integrantes e formamos um equipe multidisciplinar com profissionais do Nordeste e do Sudeste, e parceiros estratégicos em todo o país. Nosso objetivo é inspirar transformações educacionais e contribuir com o fortalecimento de comunidades de aprendizagem.

A Semente – Escola de Educação Audiovisual se apresenta à sociedade brasileira como um espaço de referência na área, e propõe a formação de uma rede de apoio, oportunidades de desenvolvimento profissional e compartilhamento de saberes e experiências, de modo a reunir pessoas, instituições e iniciativas que querem promover ações de impacto pedagógico, social e ambiental na sociedade, e assim criar mundos mais justos, felizes e saudáveis para as novas gerações.

Nossas portas estão abertas ao diálogo!

 

SEMENTE – ESCOLA DE EDUCAÇÃO AUDIOVISUAL

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